Jane Austen era apaixonada pelo abolicionista Thomas Clarkson? Pergunta da leitora Vanessa que responderei neste artigo.
Vanessa, leitora assídua do Jane Austen em Português, perguntou se eu conhecia Thomas Clarkson e se sabia de alguma coisa sobre ele e Jane Austen pois havia lido na propaganda de uma editora que a autora havia sido apaixonada por Clarkson. Atrasada, retomo o assunto. Primeiro um pouquinho sobre o nosso homem em questão.
Thomas Clarkson nasceu em 28 de março de 1760 em Wisbech, Cambridgeshire. Estudou em Cambridge e foi ordenado diácono em 1783. Na universidade tomou contato com a causa que abraçaria por toda sua vida ao escrever o ensaio Anne liceat invitos in servitutem dare (Is it lawful to enslave the unconsenting?*). O trabalho foi premiado e publicado, e partir daí Clarkson passou a conviver com outros abolicionistas e fazer parte do Comitê para Abolição do Comércio Escravo. Ele fez um trabalho incansável viajando por toda Inglaterra, conversando com as pessoas, recolhendo materiais e depoimentos sobre o comércio e as condições dos escravos transportados por navios ingleses. Trabalhou de forma tão exaustiva que, em 1794, estava doente e retirou-se para a região dos Lagos (Lake District) onde comprou uma propriedade. Em 1796 casou-se com Catherine Buck e tiveram um único filho, Thomas. Depois de dez anos, em 1804, ele voltou a viajar pela Inglaterra com o mesmo entuasiasmo até a promulgação da lei de 1807. Retomou suas viagens em 1823 e conseguiu 777 petições que foram apresentadas ao Parlamento exigindo a emancipação total do escravos. Finalmente em 1883 a lei da abolição foi aprovada. Thomas Clarkson faleceu treze anos depois em 26 de setembro de 1846.
‘He, if ever human being did it, listened exclusively to his conscience and obeyed its voice.’
Coleridge, sobre Thomas ClarksonEle, se um ser humano fez isto, escutou apenas sua consciência e obedeceu sua voz.
A única referência disponível sobre o abolicionista em relação a Jane é uma carta da própria autora. Esta carta consta do livro A Memoir of Jane Austen de J. E. Austen-Leigh. Transcrevo abaixo o trecho. A carta na íntegra pode ser lida (em inglês) no site Republic of Pemberely neste link.
She has got John Carr’s “Travels in Spain,” and I am reading a Society octavo, an “Essay on the Military Police and Institutions of the British Empire” by Capt. Pasley of the Engineers, a book which I protested against at first, but which upon trial I find delightfully written and highly entertaining. I am as much in love with the author as I ever was with Clarkson or Buchanan, or even the two Mr. Smiths of the city. […]
Ela [a mãe de Jane] está com o Viagens na Espanha de John Carr e eu lendo um livro da Society, um “Essay on the Military Police and Institutions of the British Empire” do capitão Pasley dos Engineers. Um livro que a princípio eu relutei em gostar mas após melhor julgamento achei deliciosamente bem escrito e muito divertido. Estou quase tão apaixonada pelo autor como estive por Clarkson ou Buchanan, ou até mesmo os dois senhores Smith da cidade(?) de Londres
- Claudius Buchanan, teólogo escocês e ministro da Igreja da Inglaterra, e autor do Christian Researches in Asia.
- Thomas Clarkson, escreveu vários livros.
- Os dois Smiths parece ser piada interna! Os dois são Horace e James Smith, autores de Rejected Addresses (1812).
Baseada nestas únicas linhas não se pode, de maneira alguma, afirmar que Jane tenha estado apaixonada por Thomas Clarkson. Até os dias de hoje dizemos estar apaixonada por coisas ou pessoas quando queremos expressar uma grande admiração.
A ânsia por achar um amor qualquer para Jane Austen é risível!
* É legal [dentro da lei] escravizar sem o consentimento [do escravizado]? Esta minha tradução está esquisita, mas a idéia de alguém consentir em ser escravo também me parece esquisita!
PS: Escreverei ainda outro post sobre a escravidão e as menções sobre o assunto em seus livros, Mansfield Park e Emma. Leia também: “Os abolicionistas ingleses“.
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também sou apaixonada por um monte de gente 😉
por curiosidade, qual terá sido a editora? deve ser inglesa, pois no brasil dificilmente o apreço da jane por um abolicionista inglês teria grande apelo de marketing.
Denise,
o apelo é o “amor” se é que você me entende…
Nossa, encontrei seu blog ontem, procurando produtos relacionada a Jane Austen (e, em um adendo, digo que achei uma camisa com estampa “What would Jane do?” e uma com estampa “I’d rather be at Pemberley” que chamaram minha atenção à primeira vista!) e devo dizer que ele é ótimo! Super informativo, com bons pontos de vista, e ainda me noticiou sobre o seriado inglês Emma!
Obrigado e parabéns pelo blog maravilhoso e pelos lindos trabalhos que faz (os diários e bookmarks inspirados em Jane Austen são lindos!). Até mais!
Raffael,
muito obrigada e seja bem-vindo ao Jane Austen em português!
Oi Raquel!
Acho que tem muita gente se comportando como Emma .Você sabe, fazer bodas…
rsrsrs
Lais,
parece mesmo síndrome de Emma, só que romântica! Emma era pé no chão, o partido precisava ser de peso.
Caramba, estou tão atarefada aqui no trabalho e com o início das aulas que acabei ficando um tempo sem entrar aqui. Acabei de ver o post e realmente achei muito bom!! Muito se especula sobre o que teria acontecido durante a breve vida de Jane, já que Cassandra queimou algumas das cartas que poderiam matar a nossa curiosidade. Adorei o post Raquel!!!!
beijos.
Vanessa,
de fato todas nós especulamos e cogitamos o que teria acontecido, só não podemos afirmar, mesmo o que nos parece evidente.
Isso mesmo. Pareceu claro ao ler a carta que o “estar apaixonada” era a admiração que ela sentia por ele… aí vem alguém muda o sentido… Nada a ver!
Não achei que a editora estava falando de paixão no sentido de amor/relacionamento entre homem e mulher.
Eu mesmo digo que sou apaixonada por Jane Austen por ai.