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Quando entro numa livraria procuro de imediato Jane Austen – rezando para que tenha apenas as boas editoras. Prece nem sempre atendida. Mas semana passada na Laselva encontrei de pronto o cantinho com livros da L&PM e lá estava A abadia de Northanger. Fiquei contente mas queria comprar outro livro e tentar pela enésima vez ler em viagem e não ficar enjoada. Com os novos óculos (multifocais) que nos primeiros dias me deixaram doida, resolvi arriscar e comprei Profissões para mulheres e outros artigos feministas de Virgínia Woolf.

Tenho uma certa preguiça com a maioria dos textos atuais sobre feminismo mas Virginia Woolf sempre vale a leitura. Em uma hora e quarenta minutos de vôo, com pequena turbulência, devorei o livro sem o menor sinal de desconforto físico, o que me deixou feliz com a possibilidade de leitura nas horas que sempre considerei perdidas.

Voltemos ao livro. Virgínia menciona Jane mais de uma vez. Em “Profissões para mulheres”, texto que leu em 21 de janeiro de 1931 para a Sociedade Nacional de Auxílio às Mulheres ela fala de sua profissão:

Minha profissão é a literatura; e é a profissão que, tirando o palco, menos experiência oferece às mulheres – menos, quero dizer, que sejam específicas das mulheres. Pois o caminho foi aberto muitos anos atrás – por Fanny Burney, Aphra Behn, Harriet Martineau, Jane Austen, George Eliot¹ –; muitas mulheres famosas e muitas outras desconhecidas e esquecidas vieram antes, aplainando o terreno e orientando meus passos.

Neste exemplo, de mulheres superando as dificuldades, são as ações individuais e não as coletivas que dão início às grandes mudanças, o que me dá mais certeza que não adianta fazer grupos e mais grupos para modificar o que quer que seja. Simplesmente vá lá e faça e depois, obviamente, muitos aproveitarão suas idéias para outras tantas iniciativas.

Virginia fez a resenha do livro The Women Novelists de R. Brimley Johnson, que por coincidência é um dos muitos editores que publicaram a obra de Jane Austen. Na resenha “Mulheres romancistas” ela menciona o fato de Jane esconder o que estava escrevendo quando entrava alguém na sala e fala também sobre a diferença da escrita masculina e feminina usando como exemplo as personagens de A feira das vaidades, de Thackeray e de Emma:

As primeiras palavras usadas para descrever um homem ou uma mulher geralmente bastam para revelar o sexo do escritor; mas, embora se reconheça universalmente o absurdo do herói das mulheres ou da heroína dos homens, ambos os sexos mostram uma enorme rapidez em detetar os defeitos mútuos. Ninguém há de negar a autenticidade de uma Becky Sharp ou de um Mr. Woodhouse

Sobre identificar o sexo do escritor, que eu sinceramente não sei se seria capaz, mesmo lendo o livro inteiro, escrevi um post que aborda o mesmo fato mas com viés um bocado preconceituoso: “Jane Austen e V. S. Naipaul”.

No capítulo “Nossas mulheres”, já falando sobre mulheres do período da rainha, Virgínia diz que “a única ocupação admissível, de fato, eram ser governantas ou costureiras” o que me parece um avanço quando lembramos da pobre Jane Fairfax, em Emma.

Contrapondo a visão negativa das mulheres na coletânea de ensaios do romancista Arnold Bennett, “Nossa mulheres: capítulo sobre a discórdia dos sexos”, Virgínia pergunta ao resenhista do livro, que concordava com o escritor sobre a “inferioridade” intelectual das mulheres e que educação alguma ir sanar essa falha. como se explica,

[…] de que o século XVII gerou um número maior de mulheres notáveis do que o século XVI, o século XVIII mais do que o século XVII, e o XIX mais do que os três somados juntos? Quando comparo a duquesa de Newcastle e Jane Austen, a inigualável Orinda e Emily Brontë, Mrs.Heywood e George Eliot, Alpha Behn e Charlotte Brontë, Jane Grey e Jane Harrison, o avanço na capacidade intelectual me parece não só sensivel, mas imenso; […]

Neste caso posso adiantar para vocês que no final, o resenhista rendeu-se dizendo “Se a liberdade e a educação das mulheres são dificultadas pela as expressões de minhas opiniões, não discutirei mais”.

Recomendo o Profissões para mulheres… de Virgínia Woolf pois tem muito mais do que contei aqui e também por ser uma tradução de Denise Bottmann, que a maioria de vocês conhece do não gosto de plágio. Denise também traduziu para a L&PM, Mrs. Dalloway e Ao farol.

Aliás, para quem gosta de Virgínia Woolf e adora saber detalhes dos livros traduzidos, Denise fez dois blogs durante suas traduções que são uma verdadeira delícia: traduzindo mrs. dalloway e ao farol. E tem mais esta entrevista dela sobre a autora: “Virginia Woolf feminista é “uma invenção da tradição””. Boa leitura!

Virginia Woolf e Jane Austen

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2 comentários

  1. Muito legal Raquel, adoro Virginia Woolf, Mrs. Dalloway é demais, e estou começando a ler Jane Austen agora, por Emma, infelizmente a edição que comprei não é muito convidativa, mas o que vale é a leitura né?

    Beijos, Lu!

    1. Luana,
      bom saber que está lendo Jane e quanto a Emma, recomendo a tradução de Ivo Barroso, que é um primor e tem na coleção Saraiva de Bolso com um preço muito convidativo e é completa. Digo isso pois às vezes as pessoas pensam que por ser pocket poderia ser resumida.

      Emma | Saraiva de Bolso

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