web analytics

“A matriarca dos Bennet”
por José Afonso Rodrigues Júnior
jornalista e escritor

“Meu Deus do céu! Deus me abençoe! Imagine! Ora essa! Mr. Darcy! Quem poderia supor? É verdade mesmo? Oh, minha querida Lizzy! Como você será rica e importante! Que mesadas, que jóias, que carruagens você terá! O casamento de Jane é nada em comparação com o seu! Estou tão feliz, tão contente! Um homem tão encantador! Tão bonito! Tão alto! Oh, minha querida Lizzy! Perdoe-me por ter antipatizado com ele no princípio! Espero que ele me perdoe. Minha querida Lizzy… Uma casa em Londres! Tudo o que há de melhor! Três filhas casadas! Dez mil libras por ano! Meu Deus do céu, que será de mim? Vou ficar louca… (Orgulho e Preconceito, cap. LIX, trad. Lúcio Cardoso).

Não sei se Mrs. Bennet ficou louca – ou mais louca do que já era – mas que ela conseguiu a proeza de me fazer parecer um pouco maluco, ah, isso ela conseguiu. Foi numa manhã de novembro de 2009 quando ri quase sem parar, sozinho, feito um doido, enquanto lia este trecho do capítulo LIX de Orgulho e Preconceito. Quem estava próximo a mim, perguntava qual era o motivo de tantas gargalhadas. Eu, aplicadíssimo em rir e continuar a leitura dos capítulos derradeiros do livro não me importei muito em responder.

Reproduzi a passagem acima por acreditar que ela congrega todas as características mais marcantes da personalidade da matriarca da família Bennet. Volúvel, engraçada, frívola, interesseira, exagerada, expansiva, ambiciosa, e tagarela são só algumas… Porém, o mais interessante é notar que ao contrário de Mr. Bennet, a mãe não expressou em palavras, uma possível preocupação com a felicidade de sua filha, que aos seus olhos era tão avessa a Mr. Darcy quanto ela. “Três filhas casadas! Dez mil libras por ano!”: isso é o que realmente importa para esta mãe, representante de uma época em que a maioria absoluta das mulheres, já nascia sendo preparada para o matrimônio, de preferência vantajoso, independentemente dos sentimentos nutridos.

Longe de ter má índole, Mrs. Bennet certamente desejava apenas que suas filhas tivessem as garantias e a segurança do casamento, mas é claro, que se isso viesse acompanhado por milhares de libras seria muito mais atraente. Seu amor e afeição pelas filhas são exemplificados quando a preferida Lydia parte, deixando a mãe melancólica por vários dias. Certamente, ela também ficara assim quando começou a ver a casa ficar um pouco mais vazia com Lizzy e Jane assumindo novas etapas de suas vidas.

Mas Mrs. Bennet é mais que isso. Engraçadíssima, é dona de momentos deveras espirituosos na obra. Sempre vou recordar do final do capítulo V, quando ela inicia uma discussão com uma criança, um dos vários filhos do casal Lucas. A teimosia só teve fim quando o visitante partiu. Ela é dessas. Assim como deve ter acontecido com vários outros de seus personagens, Mrs. Bennet também deve ter sido inspirada em alguém que Jane conhecia.

A despeito do que o início deste relato possa aparentar, não tenho antipatia por esta personagem criada por Jane Austen. Muito pelo contrário. Ela é uma das minhas favoritas em Orgulho e Preconceito, exatamente por ter me despertado sentimentos diversos e ter me provocado inesquecíveis oscilações de humor. Para mim, os personagens memoráveis são aqueles que me fazem falar, rir, reclamar, chorar… sozinho. Sozinho no sentido físico da palavra, pois quando estamos lendo Jane Austen nossa mente jamais fica solitária.

Mr. Bennet, 1995

Alison Steadman como Mrs. Bennet na famosa cena da piscadela para Kitty
Orgulho e preconceito, 1995 | BBC

 

Visits: 241

Artigos recomendados

17 comentários

  1. Eu tb adoro aquela parte em que ela, indisposta, doente dos “nervos” há vários dias simplesmente salta da cama e sai toda feliz porque recebeu o recado que a Lydia se casou… Sempre imagino ela deprimida, sofrendo, sofrendo… e de repente, num “furor” de felicidade! Até mandou tocar o sino para avisar os vizinhos!

  2. Consigo ver as boas intenções por trás das atitudes um tanto maquiavélicas da sra. Bennet, e até entendo o desespero dela para arranjar casamentos vantajosos para suas filhas, pois a indolência do sr. Bennet com relação ao futuro delas chega a ser irritante. Apesar de adorar a personalidade do sr. Bennet e seu humor cáustico, acho que, no papel de pai, ele deixa a desejar.

    1. Elaine,

      o encanto de Mrs. Bennet é que mesmo sendo terrivelmente chata em vários aspectos não conseguimos dizer que ela não tem razão em outros.

  3. Gosto bastante da interpretação de Brenda Blethyn no filme de 2005, mas Alison Steadman como Mrs. Bennet conseguiu me irritar e também me fazer rir ainda mais, sendo assim a minha favorita.

    Aquela voz dela é muito antipática (risos) e essa cena da piscadela é demais. Aliás, a continuação dessa cena também é muito engraçada, quando Hill entra praticamente “empurrada” para chamar Elizabeth com um pretexto qualquer, só para que Jane e Mr. Bingley fiquem a sós.

    1. Júnior,

      mais uma vez muito obrigada pela sua resenha.

      De fato o tom de voz usado por Alison Steadman está de acabar com os ouvidos da gente. Estou sempre a ouvindo gritando, Hill, Hill!

  4. Essa cena me mata de rir, e depois Kitty pergunta ” Mamãe por que está piscando para mim/” Ai a Sra Bennet é hilária!
    Ela quer o bem das filhas, afinal quando o Sr Bennet morrer, elas não terão nada, entretanto ela é ridicula nessa sua missão “Case todas as filhas com homens bonitos de boa fortuna”
    Não me impressiona o Darcy ter falado para Lizzie da sua familia!

    1. Leticia,

      mas temos que dar mão a palmatória, pois o truque de enviar Jane a cavalo para a casa de Bingley num dia chuvoso, eu certo demais!

  5. Acho muito interessante que apesar de não ser protagonista, Mrs. Bennet tem uma importância grandiosa, tanto que o livro poderia se chamar “A mãe casamenteira”, sem problemas. Mrs. Bennet equilibra a esperteza com a tolice, se é que isso é possível, coisas de Jane Austen. Gostei da Alison (com suas piscadelas fatais) e da Brenda (com aquela virada pro lado oposto ao das filhas quando Mr. Bingley é esperado na janela), tão cômicas quanto Mr. Collins.

  6. Tb me mato de rir com Mrs Bennet, compreendo suas intenções, como disse a Elaine, mas… quem tem uma sogra assim, merece canonização!
    Bjos,
    Rebeca

  7. P.s.: a Mrs. Bennet é bipolar, toma remédios anti-depressivos, tem pressão alta, problemas de tireóide, adora fofoca…Sei pq conheço uma Mrs. Bennet!

  8. Três minutos depois…
    “Mas, meu bem, diga-me qual é o prato que Mr Darcy prefere. Eu o farei amanhã.” Mrs Bennet quer começar agradando Mr Darcy pelo estômago.

Deixe uma resposta